Punido a jogar sem público, por violências
praticadas por sua torcida, um dos clubes do Campeonato Brasileiro fez um
pedido à Confederação de Futebol: permitir que assistissem a seus jogos apenas
mulheres e crianças.
O pedido foi negado, mas não deixava de
ter apreciáveis fundamentos. Afinal, crianças, via de regra, não conhecem a
violência que impregna a sociedade, e guardam a ternura na alma. E mulheres
são, em geral, menos belicosas e violentas que os homens de cujas truculência e
brutalidade têm decorrido as barbáries nos ambientes e entornos futebolísticos.
É verdade que o noticiário policial do
país tem revelado episódios de extrema violência protagonizado por mulheres,
desde que os costumes as levaram a participar dos ambientes e das atividades
antes exclusivas do então chamado "sexo forte". Compartilhando com
eles hábitos e contingências, são levadas a comportamentos e reações igualmente
agressivos. Mas isso não abala o entendimento de que a mulher é menos
suscetível do que o homem às práticas violentas.
OS DOIS POLOS
A ideia de que a alma feminina guarda,
mais do que a dos homens, predisposição para a ternura, para a tolerância, o
diálogo e a pacificação, tem sido mesmo um dos argumentos dos movimentos feministas.
Dar poder à mulher, investi-la de responsabilidades políticas, administrativas,
gerenciais, são fatores trazidos como instrumentos capazes de tornar o mundo
melhor e mais bonito. Todos os setores onde
se lhes dê mais abertura, estariam beneficiados justamente pela força de
fatores ligados a algumas qualidades historicamente tidas como intrínsecas às
mulheres.
Isso não significa que homens não possuam
ou desenvolvam essas qualidades atribuídas às mulheres. A distinção que a
contemporaneidade faz entre sexo e gênero permite melhor entender que,
independentemente de fatores biológicos, todos desenvolvemos, em maior ou menor
grau, em nosso interior, energias da polaridade masculina e feminina. E o
"anima" e o "animus" de Jung, ou o "yin" e o
"yang", da filosofia chinesa, presentes, em maior ou menor grau, em
cada um de nós.
DIREITOS E FUNÇÕES
Por muito tempo, no âmbito de nossa
cultura, um olhar estratificado acerca das distinções psicológicas entre homens
e mulheres conduziu a uma severa limitação de atividades externas
disponibilizadas a estas. Levava-se ao extremo o pressuposto de que o homem
detinha a força, o vigor físico - e até intelectual, diziam alguns -, e a
mulher, mais frágil fisicamente, era detentora de sentimentos mais refinados que
a predispunham a permanecer em casa, cuidando do "interior", enquanto
o homem lutaria pela subsistência de todos, mediante o trabalho externo.
É nesse contexto que vamos encontrar em O
Livro dos Espíritos conceitos que referendam a igualdade de direitos entre o
homem e a mulher - um avanço para a época -, mas com a ressalva de que essa igualdade
de direitos não significaria a igualdade de funções: "É preciso que cada
um tenha um lugar determinado, que o homem se ocupe do exterior e a mulher do
interior, cada um de acordo com a sua aptidão", justifica a questão 822-a.
AVANÇOS
Os tempos andaram e, mais que a conquista
de direitos iguais, as mulheres se habilitaram ao exercício de funções antes atribuídas
exclusivamente aos homens. Praticamente já não existem atividades profissionais
ou administrativas e políticas a que elas não tenham acesso.
É, pois, tempo de, também aí,
contextualizar Kardec e seus interlocutores espirituais, reconhecendo que
aquela distinção tinha, predominantemente, um conteúdo cultural, modificável
com o tempo.
Concomitantemente, porém, admita-se que,
sim, há uma polaridade masculina/feminina, milenarmente reconhecida em todas as
culturas, que, independente do gênero no qual estagiamos, todos desenvolvemos
no espírito. E que a conjugação dessas energias – a masculina e a feminina -,
quando presente em uma atividade, enriquece-a e lhe dá mais amplitude social.
A ausência da mulher, em cuja alma
predominam sentimentos refinados da polaridade feminina, em qualquer setor
social enfraquece-o e tende a brutalizá-lo.
Postado no CCEPA Opinião nº
321 (setembro/2023).
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