20 abril 2024

POR QUE JULGAMOS TANTO?

Claudia Regis Machado*

É da natureza humana fazer um julgamento, uma avaliação do mundo de acordo com suas crenças.

Não estou restringindo aqui ao aspecto moral do que é certo ou errado, mas um olhar que abrange vários itens da vida humana onde está contido também a perspectiva ética que compõem nossas crenças, a nossa percepção de mundo.

Cada pessoa é um mundo, que passa por situações e vivencias com as com as quais sofreu e aprendeu, que só ela conhece e compreende. 

Na maioria das vezes acreditamos que a nossa visão é a única válida, e isto atrapalha de ir, de ver mais além, e compreender outras perspectivas diferentes.

Precisamos ter uma abertura para saber que cada pessoa observa o mundo, o cotidiano sob seu próprio prisma, com lentes pessoais assim como nós.

Não existe problemas no processo de julgar, isto só passa a existir quando executamos de forma precipitada e imediatista. Não tomando cuidado de analisar o quanto sabemos daquela situação, daquela pessoa e o quanto não nos familiarizamos com o contexto que está inserido. Todos têm direito de expressar sua opinião, emitir seu ponto de vista e ser respeitado. Julgar não significa justificar os atos dos outros.

“Eu tenho a minha verdade e você tem a sua. Respeito é eu validar sua                                             verdade, ainda que eu não a compreenda ou discorde de você”.


Não somos juízes, não estamos fazendo justiça, mas dando um parecer, uma opinião.

O que condenamos sempre, são os preconceitos tidos como crimes e as falsas informações com a intenção de difamar e prejudicar o outro.

Expressar e compartilhar pontos de vista não quer dizer convencer o outro nem que sua opinião deva prevalecer sobre a outra. Mas nem por isso devemos deixar de falar porque existimos a partir das nossas verdades, que não são imutáveis.

Troca de opiniões, através do diálogo é ouvir e transmitir com serenidade.

As diferenças não são negativas pois ajuda a abrir a mente diante de diversas situações e a liberdade para se repensar ou não, nossa visão de mundo.

Os julgamentos que realizamos são permeados por valores e preconceitos que carregamos dentro de nós. Revelam muito a respeito de nosso caráter, nossa personalidade e até como anda a nossa vida e quando nos desconhecemos, apesar de ser uma análise simplista, somos muito mais complexos tendemos como mecanismo de defesa projetar no outro, atribuir aos outros, nossos defeitos, sentimentos e desejos; que em psicanálise é uma forma do indivíduo defender-se dos próprios desejos imputando-os a outro sujeito.  

“A alma sempre tende a julgar os outros segundo o que pensa de si mesma” 

– Giacomo Leopardi –

 Uma atitude positiva e fundamental é o autojulgamento para trazer autoconhecimento, que facilita o olhar para si e para o outro. Traz uma flexibilidade para ouvir o pensamento do outro, e de se colocar no lugar do outro para conseguir uma postura de empatia.

Infelizmente executamos o ato de julgar com mais facilidade em relação ao outro do que a nossa própria avaliação. A postura muda quando somos julgados, sentindo-nos sensibilizados e incomodados.

Por isso quando o foco do julgamento é o comportamento do outro devemos sempre ter em mente: o que pretendemos realmente? É fazer com que os outros vejam nossa visão de mundo? Devemos ter a consciência que nosso padrão, nosso modo de ver o mundo não é o único.

Devemos ter cuidado para que nossos julgamentos não sejam uma especulação da vida alheia e que o uso não seja indiscriminado e virem fofoca pois geralmente se propagam rapidamente. 

Abra sua mente e permita-se descobrir novas perspectivas para ampliar a sua visão de mundo. Faça do exercício de autoconhecimento um hábito, tornando-se assim mais gentis e tolerantes em suas análises.

[Publicado no Jornal Abertura Nº 380 - novembro - 2021]

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*Cláudia Régis Machado é psicóloga, membro do ICKS (Instituto Cultural Kardecista de Santos); autora do livro infantil "Kadú e o espírito imortal". 

05 abril 2024

TOLERÂNCIA, POSTULADO KARDECISTA

Saulo de Meira Albach - Procurador na Prefeitura Municipal de Curitiba, músico e atual presidente do CPDoc (Centro de Pesquisa e Documentação Espírita) 

O Espiritismo Kardecista ao defender a liberdade de pensamento e de consciência (crença), como se vê nas questões 833 a 842 de “O Livro dos Espíritos”, bem como ao excluir como critério de acesso à suprema felicidade a filiação a uma Igreja ou à verdade absoluta (posto que todos os sistemas de crença entendem possuir a verdade), elegendo em seu lugar a caridade – que pode ser praticada por todos, como se vê no Capítulo XV de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, deixa evidente sua adesão ao postulado da tolerância.  Em “O Que é o Espiritismo”, no interessante “diálogo com o padre”, Allan Kardec afirma que “a liberdade de consciência é consequência da liberdade de pensar, que é um dos atributos do homem; e o Espiritismo, se não a respeitasse, estaria em contradição com os seus princípios de liberdade e tolerância”.[1]

Em tempos de “intolerância galopante” penso que os espíritas devem se unir em torno de determinadas bandeiras capazes de gerar uma agenda positiva que permita ações em prol daqueles que mais sofrem com as atitudes intransigentes.

É preciso, então, mapear os grupos, instituições e valores que estão na mira das ações intransigentes para que possamos protegê-los.

No âmbito religioso preocupam as ações contra as religiões afro-brasileiras. Inúmeros relatos de atos de vandalismo contra terreiros de umbanda e seus seguidores vão se multiplicando em vários locais do país. O fato indica a radicalização de grupos de pessoas que se dizem seguidoras do Evangelho de Jesus. Temos aqui um misto de ódio religioso e preconceito racial. Ambos inaceitáveis para aquele que compreende os preceitos do Espiritismo.

No âmbito político, o discurso do ódio destilado nas propostas de candidatos à presidência da República com perfil extremista precisa ser analisado por nós espíritas à luz dos preceitos da lei de justiça, amor e caridade. Nesta seara alguns acenos simpáticos – acredite se quiser – à volta da ditadura militar merecem ser criticados com a convicção plena de que a liberdade é um valor supremo no atual estágio civilizatório das democracias ocidentais.  

Acolher os grupos LGBT também é necessário num momento em que facções de orientação neonazistas matam pessoas por conta da sua orientação sexual. Infelizmente este tema ainda é tratado sob um viés extremamente conservador pela comunidade espírita o que impede uma práxis acolhedora em relação aos gays, lésbicas e afins. Aqui não custa lembrar que Kardec propôs a tolerância e a caridade como dever primário dos espíritas.

A bandeira da tolerância nos impele, ainda, a auxiliar os pais, escolas e movimentos que buscam uma sociedade mais inclusiva para as pessoas portadoras de deficiências físicas e mentais. Desde a facilitação do acesso às casas espíritas, passando pelo apoio efetivo às políticas de inclusão, minimizar o fardo dos espíritos que estão limitados em suas ações neste plano é também uma forma de mostrar que toleramos as diferenças, coisa que ainda está longe de ser uma realidade em nosso país.

Enfim, há muitas outras demandas que resultam do postulado da tolerância. Todas elas podem ser atendidas pelos espíritas e suas instituições. Ser tolerante impõe atitude positiva para superar a intolerância. Acredito que o fundador da Doutrina Espírita toparia esse bom combate!

20 março 2024

Propostas para o Espiritismo Futuro: Quebra de Paradigma.

 Em busca de uma sociedade mais justa e igualitária

Por Sandra Regis*

A questão da Mulher – do Ser Feminino

Pensando em dar mais alguma contribuição para o tema central do Fórum: “Propostas para o Espiritismo Futuro: quebra de paradigmas”, decidi trazer uma questão, também social e muito importante, que reflete ou afeta diretamente a nossa evolução enquanto espíritos imortais, que é a questão da mulher, do ser feminino.

Este é um tema com o qual eu estou diretamente envolvida e, portanto, acho que posso ter algo a contribuir para a reflexão proposta por este Fórum.

05 março 2024

O Sonho e o Espiritismo – Uma abordagem médica e Espírita

 Maria Cristina Zaina*

A associação entre os conhecimentos médico e espírita a respeito do sonho nos parece promover acréscimo significativo no entendimento dos mecanismos que nos regem e na influência simultânea entre matéria e espírito, corpo e mente. Porém antes de mergulharmos numa análise comparativa entre estas áreas, se faz necessário recordar que quase um século os separa.

Kardec pertence ao século XIX, enquanto a maior parte das pesquisas médicas sobre o sonho e o sono se inicia efetivamente em meados do século XX. Isso, per si, justifica a necessidade de um diálogo entre estas duas áreas que, por abordar diferentes aspectos do Ser, se complementam: a medicina trata basicamente da matéria e o Espiritismo, do espírito e de suas relações com a vida corporal. É extremamente importante que possamos integrá-las para uma maior compreensão do todo.

20 fevereiro 2024

A Parte e o Todo

Alexandre Cardia Machado*

Meu cunhado e ex-presidente do ICKS, Roberto Rufo, há alguns anos me presenteou com um exemplar de A parte e o Todo, escrito por Heisenberg lá pelos anos 1960. É um livro que descreve as angústias e os desafios do desenvolvimento da Física Atômica e Quântica. Heisemberg é o autor do conhecido do chamado “Princípio da Incerteza”, que acabou com o último paradigma da Física Clássica ao afirmar que não era possível determinar ao mesmo tempo a posição e a velocidade de um elétron em seu movimento ao redor do núcleo atômico. Este mesmo princípio levou filósofos pelo mundo todo a questionar, se não podemos saber com certeza, como se comporta uma partícula, como podemos estar tão certos de como se comporta, portanto, um objeto complexo?

17 fevereiro 2024

05 fevereiro 2024

LIBERDADE, FILHA DO CONHECIMENTO

Não alcançamos a liberdade buscando a liberdade, mas sim a verdade. A liberdade não é um fim, mas uma consequência. 
Léon Tolstoi

Doutrinadores religiosos sustentam que a verdade liberta. Não se duvide. Jesus de Nazaré prenunciou que o homem estaria destinado a conhecer a verdade e que ela seria o fator determinante de sua libertação.

Por ora, no entanto, não temos mais que aproximações da verdade sobre as questões fundamentais que dizem com o universo, a inteligência dos seres, suas origens e os destinos a eles reservados. A ciência trabalha com hipóteses capazes de apontar caminhos ao

20 janeiro 2024

CARIDADE OU JUSTIÇA SOCIAL?


 Dirce Carvalho Leite – Pedagoga e Presidente do CCEPA – Centro Cultural Espírita de Porto Alegre,  RS, Brasil.



            Por um tempo longo demais, a Igreja tradicional admoestou seus fiéis com a máxima: “Fora da Igreja não há salvação”. Allan Kardec, corajosamente, ousou discordar e apresentou uma alternativa qualitativa ao propor: “Fora da Caridade não há salvação”. Nesta bandeira, o indivíduo dava um passo necessário na superação da heteronomia para a responsabilidade autônoma, que vislumbra o valor das próprias escolhas e das vitórias individuais, diante de uma ação intransferível e reflexiva, frente à realidade social em que vive.

17 janeiro 2024

RELATÓRIO DE GESTÃO 2021/2023

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DELEGADOS E AMIGOS                                    DA CEPA CEPABrasil - CNPJ 07.155.135/0001-75

RELATÓRIO DE GESTÃO DA CEPABrasil 

É com satisfação que apresentamos aos associados(as) o Relatório de Gestão da CEPABrasil referente ao mandato da diretoria executiva do período 2021/2023. Este relatório destaca os principais acontecimentos e realizações destes anos.

O fim de um mandato é sempre um momento de reflexão, avaliação e planejamento para o futuro da CEPABrasil. Acreditamos que podemos continuar a crescer e a servir com um pensamento espírita genuinamente kardecista, progressista, laico e livre pensador. Agradecemos a todos os associados(as)  e amigos(as) da CEPABrasil que contribuíram para o êxito de nossa administração.

05 janeiro 2024

REFLEXÕES

Maurice Herbert Jones*

Se Kardec não houvesse fundado, desenvolvido e propagado a Ciência Espírita, pela qual deu sua vida e seu gênio, nossa cultura não passaria de um ciscar de galinhas na crosta da terra.
Nunca saberíamos, através de pesquisas psicológicas e físicas incessantemente repetidas, o que somos, qual o nosso destino e o que a morte representa no vir-a-ser da Humanidade. 
Ele obrigou os mais famosos cientistas do século XIX a pôr de lado as suas preocupações com a matéria para descobrir e provar a existência do Espírito, como aconteceu com William Crookes, Charles Richet, Alexandre Aksakof, Ochorowics, Friedrich Zõllner e tantos outros, a enfrentar os fantasmas como Edipo enfrentou a Esfinge. Em nosso século forçou Rhine e McDougal a desenvolver na Parapsicolo¬gia as suas pesquisas, hoje vitoriosas em todo mundo. 

Dr. Urbano de Assis Xavier

Marília, SP, maio de 1946.

Reconheço que a Doutrina Espírita, no que se refere a sua essencialidade, pode ser apreciada de várias formas. Parece evidente que nossas características culturais e psicológicas são determinantes na seleção daquilo que mais nos sensibiliza, que mais se afina com a nossa natureza, merecendo, por isso, destaque especial.

Pessoalmente, identifico-me com aqueles que veem no Espiritismo, sobretudo, a ciência que, interpretando racionalmente os fenômenos mediúnicos, fez do espírito, pela primeira vez na história, objeto central da sua pesquisa. Revelando a existência do espírito como "ser concreto e circunscrito que, em certos casos, pode ser apreendido pelos nossos sentidos", Kardec inicia uma revolução conceptual que ainda não foi valorizada nem pelos espíritas.

J. Herculano Pires dizia, talvez um pouco presunçosamente, que o Espiritismo é uma síntese conceptual do mundo moderno, como o Cristianismo o foi do mundo greco-judaico-romano e o Mosaísmo do mundo antigo. Apesar do escancarado cristiano centrismo desta afirmação que parece não reconhecer na milenar cultura oriental mais do que um ensaio para o surgimento do Mosaísmo é evidente a vocação daquele Espiritismo de Allan Kardec e Leon Denis para a síntese. Vocação esquecida ou despercebida pela maioria dos espíritas, especialmente no Brasil, que aceitaram a transformação do vigoroso e promissor pensamento espírita em mais uma religião. Este processo de sectarização retirou o Espiritismo do campo aberto dos debates científicos e das especulações filosóficas e o isolou nas áreas pouco ventiladas das religiões, das crendices.

A "religião espírita'' até que é bem sucedida no Brasil, tendo conquistado adeptos e admiradores, principalmente, pelas realizações de natureza assistencial. É uma religião simpática e certamente seria a minha escolha se me obrigassem a ter religião. Não nos iludamos, porém, com esta simpatia, ela não tem profundidade. Eu também me comovo diante do trabalho abnegado de profitentes das diversas religiões. Isto, entretanto, não me arrasta para estas religiões nem modifica minha filosofia de vida. E aí está uma questão fundamental.

Já foi dito que o homem moderno não quer mais crer de olhos fechados e sim saber de olhos abertos, significando isto que o homem esclarecido da nossa época somente aceita modificar sua filosofia, isto é, sua concepção do homem e do mundo, mediante argumentação científica e filosófica robusta. Ora, o dote espírita é destacado especialmente nestas áreas e, se for inteligentemente divulgado, poderá ser valioso aliado na busca da verdade, da liberdade e na luta contra o sofrimento, objetivos comuns a todos os homens.

A consequência essencial do extraordinário diálogo de Kardec com os espíritos foi revelar a existência objetiva do mundo extra físico ou espiritual do qual o nosso mundo físico é mero subsistema, deslocando, assim, o eixo das nossas perquirições filosóficas. Do homem físico passamos para o homem espiritual que transcende aquele. Ora, considerando a existência desta dimensão extrafísica como fundamental, o Espiritismo afeta drasticamente a forma pela qual percebemos o mundo e a nós mesmos.

Esta visão espiritocêntrica e o "humanismo transcendental" que dela decorre é o cerne da filosofia espírita. Sua natureza renovadora, revolucionária é evidente. É como brisa fresca no deserto, mas é doutrina de homens para homens e só poderá ser aquilo que dela fizermos.

 

(*) Maurice Herbert Jones, eletricitário, foi conferencista espírita; ex-presidente da Federação Espírita do Rio Grande do Sul; presidente da Sociedade Espírita Luz e Caridade (atual Centro Cultural Espírita de Porto Alegre) em várias gestões, ex-assessor da CEPA-Associação Espírita Internacional. Desencarnou em 20/06/2021, aos 92 anos.

(Publicado no Jornal Opinião de novembro de 1997)