Por Beto Souza
Artigo
publicado no jornal CCEPA OPINIÃO n° 321, de setembro/2023
Roberto Souza é graduado em Teologia e Filosofia e
presidente do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, ex diretor do
Departamento de Estudos do CCEPA.
Recentemente circularam notícias
sobre os cientistas estarem perto de descobrir a “quinta força da natureza” e,
como geralmente acontece nesses momentos, cresceram também os comentários nos
grupos de estudo espíritas sobre teorias científicas que parecem se aproximar
das concepções metafísicas presentes no pensamento espiritualista universal e,
particularmente, nas respostas dos espíritos para Allan Kardec (1804-1869) sobre
as substâncias formadoras do cosmos.
No
pensamento vitalista de fins do século XVIII já existia uma aproximação, ou
tentativa de aplicação, das teorias do magnetismo aos corpos orgânicos através de
um "Magnetismo Animal", desenvolvido por Franz Anton Mesmer
(1734-1815), baseada na ação do que, então, se denominava fluidos. Conceito
este também trabalhado por Allan Kardec, principalmente no capítulo XIV do
livro "A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo",
de 1868.
Na metade do século XIX, a ideia de
que a natureza era governada por forças fundamentais ainda não estava
desenvolvida. Das forças, a gravidade era uma das mais compreendidas e para os
fenômenos físicos buscava-se a explicação por meio de teorias mecânicas
clássicas. Em "O Livro dos Espíritos", de 1857, Allan Kardec trata
das forças e elementos gerais do Universo, conforme o pensamento de sua época,
como no questionamento abaixo:
Allan Kardec, O Livro dos Espíritos,
Questão 27. Há então dois elementos
gerais do Universo: a matéria e o espírito?
“Sim e acima de tudo Deus, o Criador,
o Pai de todas as coisas. Deus, espírito e matéria constituem o princípio de
tudo o que existe, a trindade universal. Mas ao elemento material se tem que
juntar o fluido universal, que desempenha o papel de intermediário entre o
espírito e a matéria propriamente dita, por demais grosseira para que o
espírito possa exercer ação sobre ela. Embora, de certo ponto de vista, seja
lícito classificá-lo com o elemento material, ele se distingue deste por
propriedades especiais. Se o fluido universal fosse positivamente matéria,
razão não haveria para que também o espírito não o fosse. Está colocado entre o
espírito e a matéria; é fluido, como a matéria é matéria, e suscetível, pelas
suas inumeráveis combinações com a matéria e sob a ação do espírito, de
produzir a infinita variedade das coisas de que apenas conheceis uma parte
mínima. Esse fluido universal, ou primitivo, ou elementar, sendo o agente de
que o espírito se utiliza, é o princípio sem o qual a matéria estaria em
perpétuo estado de divisão e nunca adquiriria as qualidades que a gravidade lhe
dá.”
a) Esse fluido será o que designamos
pelo nome de eletricidade?
“Dissemos que ele é suscetível de
inúmeras combinações. O que chamais fluido elétrico, fluido magnético, são
modificações do fluido universal, que não é, propriamente falando, senão
matéria mais perfeita, mais sutil e que se pode considerar independente.”
Assim, para Kardec, todas as forças
eram especializações deste fluido especial, o fluido cósmico universal e sua
ação mais evidente em nossa realidade seria através do princípio vital,
conceito já teorizado em outras culturas, com diferentes nomes como Ka, Ki, Chi,
Prana, Força Ódica e outros, mas que hoje poderíamos considerar semelhante a
uma “energia vital”.
Após Kardec, que desencarnou em 1869,
a Ciência avançou em conceitos, teorias e nomenclaturas.
Em 1897, o físico britânico Joseph
John Thomson (1856-1940) descobriu o elétron, uma partícula subatômica com
carga negativa, permitindo o desenvolvimento da teoria atômica, descrevendo a
estrutura do átomo. Em 1905, o físico alemão Albert Einstein (1879-1955)
publicou artigos que revolucionaram a física e, em um deles, a teoria da
relatividade, considerando que a gravidade não é uma força à parte, mas sim uma
consequência da curvatura no “continuum espaço-tempo”, expressão desenvolvida
por Hermann Minkowski (1864-1909) para descrever o espaço e o tempo como um
conjunto único e contínuo, ao invés de separados, considerando também o tempo
como uma dimensão, a quarta, em seu sistema de coordenadas.
Assim, no início do século XX, a
teoria da relatividade geral de Einstein e a teoria eletromagnética de James Clerk Maxwell (1831-1879) eram
as duas teorias físicas mais importantes. Essas teorias tratavam de duas das
quatro forças fundamentais consideradas atualmente:
Força Gravitacional: Responsável pela atração entre
objetos com massa, como planetas, estrelas e galáxias.
Força Eletromagnética: Atua na atração e repulsão entre
partículas com carga elétrica, como elétrons e prótons.
Força Nuclear Fraca: Responsável por transformar prótons
em nêutrons e vice-versa.
Força Nuclear Forte: A força forte é a força mais
poderosa das quatro forças fundamentais, responsável pela ligação entre os
quarks, as partículas subatômicas que formam os prótons e nêutrons.
Alexandre Cardia Machado em seu livro
"Uma Breve História do Espírito", ensina que uma das teorias
formuladas para explicar o surgimento das forças é do chamado "Campo de
Higgs", onde estaríamos mergulhados e que, embora não atue nas energias
eletromagnéticas e seja conceitualmente diferente do conceito de Fluido Cósmico
Universal, interfere nas forças que envolvem aceleração como a força
gravitacional. Essa teoria de um campo quântico presente em todo Universo e
dando massa para as partículas subatômicas foi proposta em 1964 pelo físico
britânico Peter Higgs (nascido em 1929) e recebeu seu nome. Os cientistas ainda
estão tentando unificar as quatro forças fundamentais em uma única teoria, que
seria chamada de “Teoria do Tudo”. No entanto, até o momento, essa teoria ainda
não foi formulada e novas descobertas tendem a impulsionar expectativas neste
sentido.
As notícias sobre uma quinta força
universal envolvem uma partícula subatômica formada por colisões de alta
energia, chamada de “múon” e que decai em elétrons e neutrinos. Os cientistas
descobriram um comportamento diferente do esperado na aceleração de partículas,
indicando que o “múon” estaria sob a ação de alguma força que não sabem qual, diferente
das quatro fundamentais já conhecidas.
Para os espiritualistas, uma “Teoria de
Tudo” passa pela união de dois princípios, o material e o espiritual, cuja
interação ocorre devido a ação de um mediador semimaterial denominado corpo
astral, corpo espiritual ou, na nomenclatura espírita, perispírito, que uniria
as diferentes teorias explicando como se dá a transmissão da vontade espiritual,
inteligente, sobre a matéria, produzindo ordem no que sem ela seria caos e
lembrando o “Efeito do Observador”, que envolve um sistema quântico ser forçado
numa direção apenas por ser observado, ou seja, a ação de uma vontade
inteligente na organização subatômica da matéria.
De acordo com a nomenclatura de seu
tempo, Allan Kardec acreditava que a organização cosmológica era explicada pela
gravidade, magnetismo, eletricidade e a força vital, mas como especializações
de um agente unificador mais antigo, o Fluido Cósmico Universal. Kardec também
acreditava que estas forças eram conectadas e que poderiam ser unificadas em
uma única teoria. Contudo, a Ciência da época, e ainda hoje, mantém um nível de
descrédito sobre seu pensamento, por considerá-lo comprometido e influenciado
por crenças religiosas, pois ele acreditava que o Universo foi criado por Deus,
que as forças fundamentais são manifestações de uma vontade divina e que os
Espíritos existem, sobrevivem e se comunicam.
Penso que as novas descobertas têm se
aproximado de muitos dos conceitos de antigas tradições espiritualistas, como
as orientais, muito bem trabalhadas por Fritjof Capra em seu livro "O Tao
da Física" e que, no geral, os avanços científicos não invalidam as ideias
de Allan Kardec, mas demonstram estarmos todos no mesmo “Caminho”.
Fontes de Consulta
1. Allan Kardec. O Livro dos Espíritos.
2. Allan Kardec. Revista Espírita
de 1858.
3. Allan Kardec. A Gênese, os Milagres e as Predições segundo
o Espiritismo.
4. Alexandre Cardia Machado. Uma Breve História do Espírito.
1. ed. Santos, SP: ICKS, 2022.
Disponível em:
5. Google. Inteligência Artificial, IA Bard. Disponível em: https://bard.google.com/?hl=pt-BR
6. CNN Portugal. Cientistas acreditam estar perto de
descobrir a quinta força da natureza.
Disponível em:
7. Meteored. A quinta força da natureza? Físicos encontram
partícula se comportando de forma estranha. Disponível em:
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