ESPIRITISMO E EDUCAÇÃO SOCIAL (publicado no Jornal Abertura de agosto/2019)
Mauro de Mesquita Spínola Jacira Jacinto da Silva “Um sorriso quando precisaria ser sério; uma
fraqueza quando seria preciso ser firme; a severidade quando seria preciso a
doçura; uma palavra sem pensar, um nada, enfim, basta às vezes para produzir
uma impressão indelével e para fazer germinar um vício. Que se passará então
quando essas impressões forem ressentidas desde o berço, e frequentemente
durante toda a infância? Nesse aspecto, o sistema de punições é uma das
partes mais importantes a serem consideradas na educação; pois elas são
comumente a fonte da maior parte de defeitos e vícios.” (Hippolyte Léon
Denizard Rivail, Textos Pedagógicos. 1ª Ed. São Paulo. Comenius, 1998, p. 19).
A
necessidade e a premência da educação são bandeiras unânimes na sociedade
moderna, reconhecida como paradigma tanto de progresso individual quanto de
efetiva democracia e dignidade social. A partir do século XIX, consolidou-se
com mais força a defesa iluminista da educação universal, laica e livre, como
um direito de todos e ao mesmo tempo um instrumento imprescindível ao
desenvolvimento econômico e social.
Hyppolite
Rivail, o educador, e Allan Kardec, o fundador do espiritismo, as duas faces de
um mesmo pensador, tiveram na educação a sua principal linha de pensamento.
Para Kardec, a educação resumia todo o processo de evolução do espírito
encarnado. Na sua mais explícita abordagem sobre o tema, mostra o valor da
educação moral:
“Há
um elemento, que se não costuma fazer pesar na balança e sem o qual a ciência
econômica não passa de simples teoria. Esse elemento é a educação, não a
educação intelectual, mas a educação moral. Não nos referimos, porém, à
educação moral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar os
caracteres, à que incute hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos
adquiridos. (...) Quando essa arte for conhecida, compreendida e praticada, o
homem terá no mundo hábitos de ordem e de previdência para consigo mesmo e para
com os seus, de respeito a tudo o que é respeitável, hábitos que lhe permitirão
atravessar menos penosamente os maus dias inevitáveis.” (Allan
Kardec, O Livros dos Espíritos, comentário à questão 685).
É
certo que o acesso à educação progride em todo o mundo, embora em ritmo muito
inferior ao que idealizaram Kardec e outros grandes pensadores de seu século e
mais recentes. Os problemas são ainda imensos. Temos no Brasil, em particular,
uma já enorme e ainda crescente desigualdade entre o ensino em escolas públicas
e privadas; a segurança nas escolas é precária, a qualificação dos professores
é deficiente, o reconhecimento dos profissionais da educação é baixo e eivado
de preconceitos.
É
ainda mais notável a inércia observada no desenvolvimento da educação moral e
social. Em regra, a escola se dedica estritamente a conteúdo e não à formação
de valores e habilidades. A escola prepara para o vestibular e para a
competição capitalista.
A
construção de uma sociedade livre e igualitária esbarra tanto na ignorância
imperante, quanto no egoísmo e no autoritarismo dos grupos que secularmente
dominam a economia, o estado e os governos, sempre relutantes ao
desenvolvimento humano e à educação libertadora.
O
espiritismo contribui com a agenda para a educação social em vários aspectos,
tanto metodológicos quanto conceituais.
Metodologicamente,
a visão espírita da imortalidade reforça a estratégia educacional centrada no
ser humano (em especial o respeito à sua individualidade e ao desenvolvimento
de suas habilidades naturais) e na sua existência em sociedade.
Do
ponto de vista conceitual, o espiritismo oferece bases sólidas para a educação
inclusiva, solidária, voltada para o bem comum, instrumentos essenciais para as
pessoas, as famílias e as escolas construírem um mundo melhor. O estudo da
ética e da moral que se encontra na terceira parte de O livro dos espíritos
pode ser lido como uma agenda de educação ética, moral e social. São muitos os
elementos pedagógicos ali presentes, podendo-se destacar, a título de exemplo:
a liberdade de pensamento e ação para todos (Lei de liberdade), a superação do
egoísmo e do orgulho (Lei do progresso), a igualdade de direitos entre homem e
mulher e a redução da desigualdade das condições sociais (Lei de igualdade), o
respeito a todos os seres humanos, a vida em família e a vida social como
necessidades do espírito (Lei de sociedade), entre outros tópicos, todos
tratados com objetividade e modernidade por Kardec em sua principal obra.
A agenda para educação social é urgente. Menos divisão, menos egoísmo, mais solidariedade e respeito, são essenciais à nossa sobrevivência. Nesse contexto, a presença das teses espíritas na construção de novos modelos educacionais é essencial.
Jacira Jacinto da Silva - Advogada empresarial, especialista em segurança de dados aposentada como juíza de direito. Presidente da CEPA por dois mandatos Presidente da CEPABrasil por dois mandatos, Membro do CPDoc, Membro do C.E.E. José Herculano Pires, SP, Diretora Presidente e Instituidora da fundação Porta Aberta.
Mauro de Mesquita Spínola: Engenheiro, professor e pesquisador da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Consultor em Tecnologia da Informação e Proteção de Dados (vanzolini.com.br). Foi Diretor Administrativo da CEPA por dois mandatos, atual diretor de Pesquisa e Produção de conteúdo da CEPA. Membro do CPDoc, Diretor do C.E.E. José Herculano Pires (São Paulo. Presidente do Conselho Curador e Instituidor da fundação Porta Aberta.